Era noite alta. O vento e o frio davam de encontro a janela e só faziam aumentar a sensação de infelicidade. No rádio, os Cascavelletes cantavam Lobo da estepe e a solidão aumentava.
Então ela abriu a porta, cruzou o corredor e adentrou meu quarto.
Sua visão fez meus olhos brilharem. Aproximando-se lentamente deitou ao meu lado e fitou-me intensamente. Via que os seus olhos estavam marejados, que era um olhar de despedida; mas que era um olhar sincero.
Durante longo tempo permanecemos falando tudo que havia entre nós, entretanto nem uma palavra fora pronunciada. Eu queria ter algo a dizer. Quando tentei, dois dedos tocaram-me os lábios silenciando-me novamente. De sua boca ouvi:
- Fale-me de números.
Não entendi. O que ela queria dizer com números? Ora números! Esboçando uma tentativa de falar fui interrompido:
- Conte-me os números.
Sorrindo aquele riso seu, aquele riso que só ela tem, riso inocente, riso confortador, riso meu; iniciei:
- Um..
Nossos lábios lentamente se tocaram. Um beijo único, tal e qual o primeiro. Junto dele vieram as imagens, lembranças do passado, o sentimento que eu carregava dentro de mim e uma torrente de emoções.
- Dois..
Um beijo que incendiou. Beijo que deu vida própria a nossas mãos, braços, pernas e corpo. Longo beijo.
- Três..
- Quatro..
- Cinco..
- Seis..
Beijos de paixão. Beijos de amor. Beijos de saudades. Beijos com vontade.
Nesse lapso de tempo nos amamos. Apenas os números foram pronunciados. Nada mais foi dito. Tudo estava implícito.
- Sete..
Beijo de despedida. Beijo salgado de lágrimas. Sem choro. Sem rancor. Sem medo.
- Oito.
E era o beijo do adeus. Beijo de obrigado. Beijo de fique bem sempre.
Displicentemente ela levantou-se, não sem meio segundo de hesitação. Dirigindo-se lentamenta à porta, quase parou. Olhando seu rosto de perfil, percebi um mínimo de tristeza; o que ela transportava era muito maior: serenidade e certeza.
Assim fiquei, por horas, dias, noites; não sei. Sei que ao acordar pareceu-me um sonho. Mas seu perfume, no travesseiro ao lado, não deixou-me enganar.
Profundo, intenso, misterioso e, com certeza, perfeito!
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ResponderExcluiraaaahhhh, lindo :D
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