terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O nenê faz um ano - por David Coimbra

A pedido do leitor Humberto Bruschi, releia o texto publicado no caderno Meu Filho de 04/08/2008.

Meu nenê vai fazer seu primeiro aniversário agora, 18 de agosto. Estarei na China, a um oceano de distância. Há mais de um ano escrevo sobre ele – já escrevia quando seu nascimento não passava de intenção, antes da gravidez. Nesse tempo, tive de passar pelo teste do espermograma, entrar na salinha de masturbação e, bem, fazer o que se faz na salinha de masturbação. Tive de enfrentar o medo de que o tampão caísse, que tampões de grávidas caem, e acabei ouvindo a frase terrível:

– Rompeu a bolsa!

Descobri, ainda, que a música pode fazer uma grávida chorar, mas também acalma nenês de um dia de vida e os põe para dormir. Que um recém-nascido, mesmo sem falar, nem andar, nem conseguir segurar nada nas mãozinhas, pode viver muitas aventuras, como os perigos de um arroto mal-ajambrado, a angústia de uma mamadeira tardia ou a ameaça de penetração por um traiçoeiro supositório de glicerina. Descobri, também, que o nenê passa o dia fazendo exatamente isso: descobrindo. Ele descobre as sensações, os gostos e a tonalidade das cores, como sentar, pegar, olhar e até a mamar.

O nenê vive aprendendo.

E eu com ele. Pois aprendi algumas lições. Uma delas é uma constatação perturbadora: estou apaixonado por um homem. E de uma forma como jamais estive apaixonado por mulher alguma. Nunca pensei...

Outra é que, se é verdade que o nenê depende de mim, não é menos verdade que dependo dele. Minha tranquilidade está atada ao seu bem-estar. E já sei que será assim para sempre, o que é meio assustador – os botões que controlam o meu equilíbrio estão fora de mim, e não sou eu quem os manipula. Sentir algo tão intenso não é uma bênção, como muitos pais afirmam. É uma responsabilidade. Preciso estar à altura deste sentimento. Lembro de uma pergunta que vivem me fazendo:

– Um filho muda tudo na vida da gente, não é?

Pois sabe que não é? Um filho não muda tanto a vida da gente. Continuo fazendo mais ou menos as mesmas coisas que fazia e pensando mais ou menos as mesmas coisas que pensava antes, com pequenas adaptações de rotina que, afinal, não são importantes. O que mudou, quando me tornei pai, mudou por causa daquele sentimento ao qual me referi acima. Por causa da responsabilidade. Dizem que um pai deve dar o que há de melhor PARA o seu filho. Nada disso. Na verdade, e foi isso o mais importante de tudo que aprendi, um pai tem que ser o melhor que puder PELO seu filho. E é assim que é, e isso é poderoso: hoje, tenho de ser uma pessoa melhor do que eu era. Melhor do que jamais quis ser.


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