segunda-feira, 26 de março de 2012

O coração feminino

Por Carol Flores.

"Deixamos a nossa conta bancária no negativo, gastamos 1/5 do nosso salário nos cabelos, compramos cinco esmaltes da mesma cor de uma vez, que só o cérebro feminino é capaz da façanha de distinguir a diferença de tons. Estouramos o limite do cartão de crédito comprando areia, cimento e brita para construir muros enormes, que nos protejam de qualquer babaca que tente se aproximar, pois o último furtou pedacinhos do nosso coração, que até hoje estampam os postes com a palavra WANTED.

Gastamos a maior parte do nosso tempo nos preparando para quando o cara certo chegar, que nem nos damos conta dos preciosos minutos que correm ralo abaixo todos os dias. Esticamos os cabelos, colorimos as unhas, acreditamos que é possível perder até 400 calorias em uma hora de corrida diária, e que as aulas de pilates nos devolverão a autoestima. Fazemos um estoque de hidratantes corporais, que passamos para dormir com nós mesmas. Sem contar a variedade de perfumes para todas as estações do ano. Mas não somos fúteis não, nos preocupamos com o intelecto também. Fazemos curso superior, lemos sobre diversos assuntos, cozinhamos, tricotamos, e até entendemos sobre futebol e MMA. E ah, somos profissionais competentes também.

Nos preparamos de segunda a quinta, para a tão cobiçada sexta-feira. E sabe para que? Para uma noitada vazia, ou para a mais pedida! Ficar em casa sozinhas, varando a noite na companhia de uma bebida com algum teor alcoólico, comida rica em lipídios e carboidratos, DVD de mulherzinha e celular na mão, ou embaixo do travesseiro. Olhamos de uma em uma hora o bendito, na esperança de o príncipe ter perdido a sua carruagem na curva para o fim do mundo onde habitamos. Afinal, no reino de tão distante também há antenas que captam o sinal do maldito aparelhinho.

Gostamos de teatrinho. Estamos sempre indisponíveis, sempre há uma barreira com dez bons metros de altura e uma placa branca com letras vermelhas em negrito dizendo: Cuidado cão raivoso! Mas que na verdade quer dizer: Sou um pobre felino abandonado, faça-me um carinho porque eu não vou te arranhar, e se o fizer será só charme.

A rejeição provoca um dos medos mais difíceis de serem explicados. É melhor ficar na retranca, melhor continuar no miojo de cada dia sabor galinha caipira, pois se eu resolver me aventurar com um capeletti de berinjela camembert com molho branco e pesto de tomate seco, sou capaz de me engasgar.Estamos construindo a nossa própria Muralha da China, com medo do amor achar uma brecha e invadir a nossa zona de conforto. Ninguém quer mais arriscar, ninguém quer tomar a iniciativa por medo. Medo de não ter grana suficiente para comprar caixas e caixas de Super Bonder para colar o seu coração, que a última criatura que o habitou, o quebrou em 1 bilhão de pedaços, pisou em cima e saiu com várias partes grudadas na sola do sapato, que jamais acharão o caminho do chão da sala novamente.

É sério, alguém tem que ceder, meter o pé na porta, pular a ponte do castelo com vários jacarés famintos no laguinho. Não há garantias de nada, mas alguém tem que dar a cara para bater e dizer: Cara, eu sou brega às vezes, escuto sertanejo universitário, amo massa com sardinha, assisto ao Domingão do Faustão e Esquenta aos domingos, mesmo odiando todas as merdas que aquele gordo idiota fala, e o show de excentricidade no programa da Regina Casé. Sim, eu canto All By Myself no chuveiro, choro sem motivos, e perco horas filosofando comigo mesma sobre meu status quo afetivo. Sabe por quê? Porque eu me sinto só, simples assim. Até me agrada a minha própria companhia, mas não quero uma overdose dela. A verdade é que sou uma pessoa covarde, pois não tomo a iniciativa mesmo desejando loucamente alguém.

Quero rir, quero chorar, sentir saudade, quero apelidinhos bregas, e frases de amor mais bregas ainda, também quero os programetes de índio nos fins de semana.Quero viver no limite, dormir pouco, sentir a barriga doer de ansiedade. Quero me permitir amar quem quiser me amar também. Só não quero ser uma alga vagando na imensidão do mar, e nem quero ser 40, prefiro ser 8 ou 80. Não quero mais me preparar para as curvas da vida, quero pegar a Free Way a 120 Km/h, despida de todos os medos e incertezas. A única coisa que desejo é que alguém esteja lá, de braços abertos me esperando. Não tenho a pretensão de viver um belíssimo filme romântico todos os dias, apenas necessito de uma cena, uma cena que transcenda a necessidade de um início, meio e fim, que acabe com as minhas sextas-feiras solitárias."

É verdade ou devaneio?

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