Certo dia conheci uma garota. Ela havia morado a vida inteira em uma grande cidade. Contou-me dos perigos que haviam nas ruas, do recolhimento dentro de seu condomínio, contou-me dos horários certos e das noites que passava olhando outras janelas.
Um dia trouxe-a para conhecer o meu mundo.
Eu, moro numa cidade pacata, simples, com um estilo interiorano próprio de ser. Chegamos tarde da noite; pela manhã ela disse-me que não havia conseguido dormir nada. Apesar de conviver com o barulho das sirenes, dos carros acelerando e freando, das pessoas que falavam todas juntas e nada se poderia ouvir, ela estranhou o som do nada. O barulhinho dos grilos, um gato que pisava nas folhas secas do meu pátio, um cachorro solitário que ao longe uivava.
Durante o dia ela se impressionou com as pessoas que se conheciam na rua: um que parava para conversar, outro que tinha em suas mãos cestos de frutas e as distribuía, um cheiro de pão quentinho que saía pela janela da vizinha. Tudo muito estranho, ela me disse.
Nesta noite, então, sentamos na frente de casa. Assim que o sol se pôs, por detrás de outro monte surgiu um clarão. Petrificada, ela teve o primeiro vislumbre de um nascer da lua. Tal como dia, fez-se a noite. Deitados na grama, ficamos por horas olhando apenas para o mar de estrelas. Ela disse-me que, por conta da claridão dos arranha-céus de sua cidade, nunca tinha visto espetáculo tão bonito. Nesta mesma noite ela dormiu.
Agora mesmo lembrei-me dela; lembrei-me daquela noite; lembrei das coisas que nunca devo esquecer. Apaguei as luzes da casa, desliguei a tv e o rádio, seitei-me na varanda e só quero ficar. Estar aqui olhando e vendo apenas o som ao redor.
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